quinta-feira, 20 de novembro de 2014

SER LIVRE DIANTE DE DEUS


As religiões nem sempre foram caminhos de autonomia para o ser humano. Infelizmente foram muito mais caminho de heteronomia e de violência. (Autonomia significa algo que se move por si mesmo, que anda com as suas próprias pernas. Heteronomia significa que para andar precisa ser empurrado, alguém tem que empurrar). E você como cristão é autônomo ou heterônomo?

Os críticos das religiões têm razão na hora de criticar que na história da humanidade as religiões serviram muito mais como opressão, de violência e de heteronomia do que realização do bem e da justiça.

As três religiões monoteístas: Judaísmo, Cristianismo e o Islamismo têm nas suas histórias momentos cruéis, nenhuma delas é limpa e imaculada; ao contrário, infelizmente cada uma delas têm manchas terríveis na sua história. Os judeus foram cruéis em nome de Javé ao invadir a terra que era de outros povos. Os cristãos foram cruéis em nome de Cristo ao conquistar povos e justificar até mesmo a escravidão. O islamismo continua sendo utilizado de modo extremista até hoje. São apenas exemplos de que nenhuma dessas três religiões monoteístas encontra-se limpa. Não se trata tampouco de dizer qual delas cometeu maior mal no mundo (aqui entre nós, creio que os bancos e os governos corruptos fizeram muito mais mal no mundo do que essas três religiões juntas).

Não vou fazer aqui uma crítica gratuita às religiões, a única intenção aqui é a formação, pois o saber, o conhecer, pode nos ajudar no momento de amarmos mais.

O que devemos nos perguntar é se as religiões são mesmo caminho de maldade em si mesma ou não. A resposta deve ser não, pois como é que podemos seguir uma religião sabendo que ela faz mal às pessoas? Vamos procurar fundamentar a nossa resposta.

A religião para ser autêntica deve ser caminho de liberdade, deve ser caminho de autonomia e não de opressão ou de heteronomia. Ninguém gosta de ser empurrado ou levado aos lugares que não quer ir. Todos desejamos a liberdade para decidir o que será melhor para nós.

Acontece que todas as religiões são humanas como expressão. Nenhuma dessas três religiões caíram prontas do céu. A organização delas é totalmente humana. Todas as religiões como linguagem são humanas. Quando entramos no âmbito da fé, falamos que a nossa religião nasceu de uma inspiração divina. Assim afirmam os judeus, nós, cristãos, e também os muçulmanos.

Ficando na nossa religião, nós afirmamos que Jesus Cristo é o Filho de Deus, esta é a base divina da nossa religião. O que precisa de um ato de fé, ou seja, existem pessoas que não vão aceitar isto e dirão que Jesus não passava de um homem, que era apenas um homem qualquer. Mas para nós, que temos fé, Ele é o Filho de Deus, o Deus encarnado, Aquele que venceu a morte e continua vivo no meio de nós. Repito, esta verdade pertence ao mundo da fé, ao mundo do “eu creio” e do “nós cremos”.

Nós fundamentamos a nossa fé na experiência dos primeiros cristãos, portanto, na fé de homens e mulheres que conheceram Jesus, que viveram com Ele e que foram testemunhas privilegiadas. Essas primeiras experiências com o Senhor foram escritas e estão contidas no livro que conhecemos como Novo Testamento. Esse livro para nós é um livro sagrado, pois guarda as experiências sagradas dessas pessoas. (Entendamos aqui sagrado não como algo que está fora de nós, mas algo que é muito caro para a gente, que amamos demais, que é muito importante para nós. Alguns afirmam que a mãe é sagrada, que a família é sagrada, que a esposa é sagrada, que a namorada é sagrada, que a cama do casal é sagrada etc).

A fé das pessoas sempre é sagrada, mesmo que a pessoa acredite muito mais num pedaço de gesso do que no amor misericordioso do Pai. Essa fé é sagrada e merece respeito sempre. Pois a fé faz parte do nosso santuário pessoal, daquela intimidade que ninguém mais conhece, somente você e Deus. A fé mora ali, no mesmo lugar onde mora o amor, a amizade, a gratuidade, o bem, o gosto pela beleza, pela justiça, o desejo de ser mais, de ser feliz, de não errar tanto. Esse é o santuário de cada um, ali mora a fé, por isso a fé merece respeito sempre, mesmo que seja uma fé ingênua e simples. O que não significa que não devamos procurar amadurecer a nossa fé. Ninguém deve se contentar com apenas rezar o terço, ou fazer caminhadas nas procissões, fazer promessas, rezar pulando (tudo isto pode ser importante), mas somos convidados a caminhar sempre, a buscar a intimidade, a profundidade na nossa relação com Deus.

Na base da nossa fé está a experiência divina de um Deus que por amor enviou o seu Filho ao mundo. Como organização, a religião é totalmente humana, é histórica, precisa da cultura, dos costumes para se expressar. Assim podemos dizer que a religião nasce sempre como expressão de Amor de Deus, mas na hora de colocarmos isso em prática, quase sempre falhamos, pois a nossa parte é falível.

A religião para ser autêntica deve ser como uma mão estendida ao crente no caminho da liberdade e na saudável relação filial com Deus. Isto é, a religião deve ajudar o crente a caminhar confiante em Deus, a igreja deve ser um lugar privilegiado desta aprendizagem. A comunidade deve ser especialista em ajudar as pessoas a confiar mais em Deus do que em normas. A religião deve ser liberdade e não medo, deve ser confiança em Deus e não ameaças.

Quem é que não gosta de caminhar com os próprios pés? Pois Jesus veio justamente para nos ajudar neste caminho de liberdade pessoal, que somente poderá ser plena como expressão desse amor construído no silêncio do encontro com Ele. É uma beleza ver cristãos livres diante da vida! Livres e responsáveis, que não temem diante dos irmãos e diante do Senhor não como expressão da sua arrogância, mas da sua confiança, que não precisam fingir o que não são, que não estão preocupados demais em agradar todo mundo porque sabem que o seu agir está pautado na palavra de Deus e não apenas em expectativas humanas.

Todas as religiões nasceram boas (o Concílio Vaticano II afirma timidamente que em cada uma delas habita a sementinha do Verbo). Infelizmente a organização dela, a parte humana, deixa muitas vezes a desejar, mas a boa notícia é que estamos caminhando, que estamos aprendendo. Não podemos mais repetir erros do passado. Graças a Deus, com o nosso atual Papa, voltamos devagarinho o nosso olhar à vida real das pessoas. É como se o Papa dissesse para cada cristão que ele não precisa deixar de ser o que é para ser cristão. É com certeza uma confiança inabalável em Deus, é confiar que é Deus quem conduz a nossa história. Ainda bem que Deus age misteriosamente na nossa história que chega a nos surpreender de tanto em tanto.

A religião hoje pode ser caminho de imaturidade, de dependência doentia e até mesmo de violência; mas ela também pode ser uma boa notícia que começa pela sua vida, que perpassa a vida da família, que chega até as nossas comunidades produzindo vida nova.

Sendo assim a religião é um lugar onde nos sentimos bem, porque é um espaço da nossa casa e não um lugar de medo, onde vamos cumprir com as nossas obrigações (Cansei de ouvir “vou a missa para cumprir com a minha obrigação de cristão”. Para um cristão maduro não pode existir obrigações, mas sim responsabilidade e atitudes de gratuidades que mostrem com gestos, palavras e vida o que de verdade acredita).

A liberdade diante de Deus é o primeiro sinal de maturidade religiosa. 


* Fontes das magens: Internet.

sexta-feira, 7 de novembro de 2014

MORTE E RESSURREIÇÃO

Domingo passado celebramos o dia dos finados, um bom dia para refletirmos sobre o seu significado para nós cristãos.

A morte, como uma realidade, deveria ser um fato natural como o próprio nascimento. Atualmente ela deixou de ser um fato familiar, motivo para encontros, momento de espiritualidade e vivência normal do luto. Hoje quase que temos vergonha da morte, sentimos como algo incômodo e por isso ela é escondida; alugam-se lugares especiais para o velório e quanto mais rápido for o enterro melhor. Infelizmente no mundo moderno não temos mais tempo para as coisas humanas importantes.

A morte infelizmente é o fim da vida neste mundo e nós que nos apegamos tanto à vida, que amamos viver, ficamos tristes com ela, por isso a morte jamais é bem-vinda. Lembro que costumava brincar dizendo que “algum dia a gente vai se encontrar no céu, pois temos essa esperança e nesse lugar encontraremos a plenitude, mas quanto mais tarde, melhor”.

Ninguém tem pressa de deixar este mundo. Nenhum cristão em sã consciência pode desejar a morte. É compreensível que num momento de desespero as pessoas se queixem dizendo que seria melhor morrer, mas depois que os percalços passam, a vida recupera toda a sua beleza e cresce o desejo de continuar vivendo.

Nós, cristãos católicos, fazemos uma confusão quando chega o dia dos finados. Repetimos uma frase bem inocente sem pensarmos no seu significado. “Vamos rezar pela alma de fulano”.

O que está na cabeça destas pessoas é que o ser humano se divide em duas partes: o corpo e a alma. Acreditam que quando alguém morre o corpo do falecido se destrói e a alma sai voando por aí. (Esta compreensão pertence à filosofia grega e não ao cristianismo. O filósofo Platão afirmava que o corpo é uma prisão para o ser humano, cuja libertação acontece com a morte).

O cristianismo tem uma visão totalmente diferente, pois ele não tem a sua base na filosofia grega, mas na sabedoria semita (ou seja, a sabedoria do povo do deserto, do povo da Bíblia).

O ser humano para o cristianismo é uma Unidade, não se divide em partes, corpo e alma, mas distingue dimensões que estão unidas, a dimensão corporal e espiritual. O ser humano para o cristianismo é Uno (unidade), não se divide em duas partes, por isso o cristão não pode dizer “tenho corpo ou tenho alma”, é mais coerente dizer “sou corpo, sou um ser espiritual”.

O cristianismo, em nome da missão evangelizadora, utilizou a filosofia grega como linguagem que, naquela época, era como o inglês de hoje (que devemos utilizar se quisermos ser compreendidos). O cristianismo utilizou a filosofia grega como a sua linguagem e as consequências foram desastrosas, pois quando se divide o ser humano em corpo e alma como os gregos, a tendência é menosprezar o corpo e supervalorizar a alma. Desse modo tivemos uma compreensão dualista da realidade humana (alma x corpo; bem x mal; claridade x escuridão; céus x mundo; branco x preto etc.).

De acordo com a compreensão dualista tudo o que pertence ao corpo é mundano, ruim, maldade, escuridão, pecado e condenação e tudo o que pertence à alma é bom, claridade, pertence à santidade e à salvação (por muito tempo para os católicos a santidade consistia em rejeitar as coisas do mundo e tudo relacionado ao corpo e abraçar tudo o que têm a ver com a alma).

Podemos perceber ainda hoje as consequências dessa compreensão na nossa espiritualidade, nas nossas pastorais e na nossa relação com o mundo e com a nossa própria corporeidade. Toda separação radical é terrível, quando vemos que por aqui somente têm capetas e no outro lado somente têm anjos, alguma coisa pode estar errada. (É fácil perceber essa ideia na política cuja disputa ainda está viva na memória. Nas propagandas, para o segundo turno, apresentavam claramente essas ideias. O outro partido é o caminho do mal e o meu partido é a salvação. Neste partido somente têm honestos e no outro, somente corruptos. Lutas terríveis entre “santos e demônios”. Seriamos ingênuos demais se acreditássemos nessas histórias inventadas para enganar os mais simples, pois a nossa experiência nos mostra que essas realidades fazem parte do coração humano e não de um determinado partido político).

A realidade humana é uma Unidade afirma o cristianismo, portanto o ser humano é Uno na Vida e é Uno na Morte. Quando uma pessoa morre, morre mesmo; não sai do seu corpo uma alma que estará pairando por aí. A morte humana é morte mesmo. É mais ou menos como se a porta da vida, neste mundo, tivesse se fechado. Acabou, agora é silêncio absoluto.

A esperança cristã abre esta mesma porta que se fechou para uma confiança plena. Nesta porta nos lançamos na confiança nos braços do nosso Pai que é Criador. A fé cristã afirma que a morte não tem a última palavra, pois Deus Pai não se esquece de nenhum dos seus filhos. Nesta porta que se abre, nós já não temos absolutamente mais nada a fazer (o falecido está nos braços do Pai, agora pertence totalmente à Misericórdia dele).

Deus que é Pai e Criador é o único capaz de restituir a nossa vida, de recriar a nossa existência, somente Ele pode nos fazer viver novamente, agora numa nova realidade que nenhum de nós conhece ou pode conhecer a não ser pela fé na própria ressurreição de Jesus Cristo. É na ressurreição Dele que encontramos luzes para afirmar que Deus Pai não se esquecerá de nós. (Então é importante perceber que não se trata de um conto de fada, pois a nossa fé têm raízes profundas na Páscoa do Nosso Senhor que naturalmente pertence ao mundo da fé). Desse modo, é possível afirmar com “certeza” confiante que em Jesus sabemos quem somos e sabemos o que acontecerá conosco também após a nossa morte. Eis a nossa fé, eis a nossa esperança.

Alguém poderá perguntar por que devemos rezar, então, pelos nossos falecidos e a resposta é simples. Nós não rezamos pelos nossos mortos para convencer Deus a ser bom com eles. Deus não precisa ser convencido para ser misericordioso, Ele Pai e é Criador. A oração pelos nossos falecidos deve ser uma grande Ação de Graças. “Obrigado Senhor pela Vida, pela memória de fulano”. (Veja que é muito melhor dizer “vida ou memória”, do que dizer “pela alma”). “Obrigado por nos ter permitido o privilégio de conviver, de compartilhar o mundo com fulano”... etc.

É muito mais cristão rezar dando graças a Deus do que pretender dizer a Deus o que Ele deve fazer. A oração tem que nos levar à solidariedade com os familiares do falecido, não como um favor que deve ser feito, mas como uma atitude de alguém que têm “com-paixão” e se coloca silenciosamente ao lado destas pessoas como um irmão ou como uma irmã.

A oração deve nos ajudar a tomar consciência da importância e da beleza da vida e que todos estamos à caminho da irmã morte e por isso devemos procurar viver com gratidão, com alegria e muita esperança confiante Naquele que é capaz de Recriar a vida e “fazer novas todas as coisas”.  

* Fonte das imagens: internet.

sábado, 1 de novembro de 2014

DESAFIOS DA SANTIDADE HOJE

Não faz muito tempo a santidade era compreendida como uma tarefa, algo a ser feito, algo a ser realizado. De modo que quanto mais a pessoa realizava coisas, mais ela era considerada santa. Aqui entra a perigosa ideia do mérito, eu mereço ser santo ou santa porque eu faço tudo direitinho, cumpro os mandamentos, dou esmola, pago o meu dízimo, faço um monte de atividades, sou bom mesmo.

Não faz muito tempo a santidade era considerada como renúncia ao mundo, de modo que se alguém quisesse ser santo ou santa devia escapar do mundo, evitando todas as “suas tentações”. O mundo era visto como a “casa do demônio” do qual o ser humano devia escapar. Nada de política, nada de diversão, nada de prazer; se a pessoa gostava de um churrasco devia renunciar, se gostasse de cafezinho devia renunciar, porque o mundo é fonte de pecado e de maldade, ele é um “vale de lágrimas”.

Não faz muito tempo a santidade era compreendida como uma renúncia a si mesmo, de modo que a pessoa santa devia deixar de ser ela mesma. A pessoa fazia o possível ou o impossível para deixar de ser humano, usava uma roupa pesada e triste, algo que cobrisse tudo, pois até mesmo a forma bonita do corpo poderia ser maldade, utilizava-se a penitência, faziam sofrer o corpo como caminho de perfeição, viviam em constante oração porque Deus gostava muito de ser adorado durante vinte e quatro horas por dia. Algumas pessoas chegaram a mudar até o nome para deixar de ser elas mesmas; outros mudam até a voz porque existe até mesmo um tom adequado de voz que é divina e quanto mais sussurram ou falam de forma chorosa mais se assemelham aos anjos.

Graças a Deus hoje compreendemos a santidade numa perspectiva muito mais ampla; graças a Deus voltamos para a Sagrada Escritura. Recuperamos as alegrias das bem-aventuranças, as alegrias das bodas de Canã, as alegrias do abraço do Pai ao filho pródigo, as alegrias daqueles que são considerados benditos e benditas do Pai porque alguém estava com fome, com sede, nu, doente, na cadeia e foram atendidos nas suas necessidades, alguém era migrante e foi acolhido. Vocês são benditos do meu Pai, venham receber o abraço do Pai porque você fizeram as coisas sem jamais esperar recompensa, tanto que vocês nem sabiam que tinham feitos tudo aquilo, porque foram gratuitos com os seus irmãos.

A santidade hoje deve ser compreendida antes de tudo como a perfeição do Pai, “Sejam perfeitos como meu Pai do Céu”. Muitos ficam assustados com esta proposta, pois entende que é impossível ser perfeito como o Pai; esquecemos, porém, que fomos feitos à “imagem e semelhança dele”. A nossa humanidade é um reflexo do Pai. Ele nos fez humanos, homem, mulher e não nos dotou de nenhuma asa para que não tenhamos a tentação de sermos anjos; não somos anjos, somos humanos porque Deus nos fez assim. Devemos ser perfeitos sendo humanos. Alguns entendem erradamente e buscam imitar os anjos, isso é imitação, a vida real passa pela nossa segunda-feira, pelo dia-a-dia. Muitos pretendem renunciar à sua humanidade para ser perfeito como o Pai, mas a única perfeição possível passa pela nossa humanidade.

Quanto mais humano você for, mais será parecido com o Pai, porque você conhecerá muito bem o seu coração, conhecerá todas as suas qualidades, todos os seus defeitos e procurará melhorar, procurará humanizar-se sempre e o seu coração procurará ser misericordioso com todos e saberá que a perfeição não consiste em algo matemático, mas num caminho que começa com a dureza da segunda-feira e chega até às delícias do encontro do domingo em família, que passa pela vida cotidiana, pelo trabalho, pelos encontros com os outros, pela intimidade diária.

A santidade compreendida como renúncia constante é esquizofrênica porque se trata de uma batalha contra si mesmo, perde-se muita energia procurando vencer tentações e deixa-se de lado a vida diária, deixa-se de lado a humanidade. Pessoas assim podem ser cheias de boas intenções, aparentemente são corretas, não saem da igreja, mas humanamente são falhos porque se colocam elas mesmas como parâmetros de perfeição, todos e todas têm que ser como elas.

A santidade saudável passa por assumir a nossa humanidade e aqui é preciso compreender muito bem para não cairmos em equívocos. A humanidade não significa condescendência como os equívocos, com os erros, com os pecados, com os nossos defeitos. Não significa aceitar tudo em nome da humanidade. Ninguém deveria dizer, por exemplo, que devemos aceitar os seus equívocos, os seus pecados em nome da humanidade, não se trata de uma desculpa. “Sou humano mesmo, então posso me enganar, posso pecar, posso ser limitado”. Não!, aceitar a nossa humanidade é trabalhar para que apareça o melhor de nós, é fazer a nossa parte para que a “imagem e semelhança de Deus” não se apague, não se torne uma marca escura e triste.

Deus quando viu o homem e a mulher gostou muito do que fez. Mas todos nós costumamos esquecer o brilho dessa imagem divina em nós e vamos trilhando caminhos que nos afastam dessa imagem. A desumanização consiste justamente nesta tristeza empobrecedora da nossa humanidade. Fomos feito para a alegria, mas somos tristes, fomos feitos para o amor, mas não temos tempo para ele, fomos feitos para viver com os outros, mas preferimos o isolamento, fomos feitos para a compaixão, mas somos cruéis, fomos feitos para acolher, mas julgamos as pessoas pela sua cor e pior, ainda achamos que a nossa cor seja muito melhor.

A santidade passa pela humanidade, quanto mais humano, mais divino, pois sendo totalmente humano estaremos assumindo a imagem de Deus em nós, o seu espírito que nos dá vida; a santidade autêntica passa pela nossa frágil humanidade. Se Deus quisesse anjos não teria feito o que fez, pessoas, homens e mulheres maravilhosos, generosos, mas ao mesmo tempo mesquinhos e traiçoeiros. Mas foi o que Deus fez e a nossa alegria maior deve ser aprofundar a nossa humanidade e não fugir para refugiar-nos em pseudo espiritualidade que ensina que a santidade é renúncia à humanidade.

O mundo está se desumanizando, os cristãos devem lembrar ao mundo o belo significado de ser humano. Devemos encher o mundo de gestos humanos, porque cada gesto autenticamente humano é um gesto cristão. Não estão em contradição.

Ser santo é acolher Deus em nós, é aceitar que realmente somos imagens e semelhanças, é deixar-se conduzir, é assumir esta beleza que significa ser filho e filha de Deus.

Aceitar o amor gratuito de Deus é a pura santidade.

Ser santo é assumir este amor gratuito na vida, é colocar este maravilhoso óculo de Deus e começar a enxergar o mundo com a visão do amor. E o mundo que é a nossa casa se torna o lugar perfeito para vivermos a nossa vida, então como um segundo passo podemos fazer as coisas. Veja que fazer coisas vem sempre depois. O fazer deve expressar o que somos e vivemos.

O nosso trabalho pastoral é importante, a nossa prática é fundamental, mas não é a pastoral, nem a prática o que nos tornam santos. Eles podem expressar o nosso amor, nada mais do que isso. Isto é importante. Têm pessoas que acredita que são santas porque rezam, têm outras que pensam que são santas porque praticam caridade, têm pessoas que pensam que são santas porque fogem do mundo como se este fosse o capeta. 

A pessoa deve rezar para expressar o imenso amor do Pai, as pessoas devem praticar a caridade porque o amor do Pai as leva a isso, algumas pessoas evitam as maldades do mundo porque sabem que nem tudo convém ao ser humano.

A santidade não é fazer coisas (a prática vem depois como expressão do que vivemos, veja que o que fazemos somente tem sentido se vivemos coerentemente. Se uma pessoa pratica a caridade, dá um prato de comida, paga o seu dízimo, visita santuários, mas é um mal educado, em primeiro lugar deveria ser humano antes de ser santo). A santidade também é fazer coisas, mas como expressão do que se vive. A santidade não é uma renúncia ao mundo, devemos reconhecer que se o mundo não é um bom lugar deve-se também à falta de compromisso cristão.

O mundo é a nossa casa, devemos lutar para que seja um lugar melhor para todos. O cristão não pode fugir do mundo, ao contrário, deve abraçar o mundo, pois ele é a casa comum, lugar onde os filhos dos filhos procurarão viver em paz.

A santidade não é renunciar a si mesmo, é assumir com misericórdia o que somos e procurar que a “Imagem do Criador” em nós não se pague.

Quanto mais humanos, mais divinos. Com certeza, nem você, nem eu ficaremos como uma figura de mármore sobre o altar de uma igreja, mas se a gente procurar a fidelidade ao brilho de Deus em nós, com certeza seremos felizes, pois seremos fieis ao seu sopro divino em nós. Isso é santidade porque desse modo somos agradáveis a Deus. Feliz dia de todos os santos!

* Imagens: Internet.